O ponto de rupturaLuís Fernando Veríssimo
Não me lembro de título, diretor, nada. Era um filme italiano com o Mastroianni. Faz anos. O Mastroianni tinha uma obsessão: vivia enchendo balões até que arebentassem. Precisava descobrir o ponto exato que antecedia a ruptura dos balões, o exato ponto em que um sopro, um hálito a mais faria o balão estourar na sua cara. E é claro que só descobria até onde podia soprar depois que o balão estourava na sua cara. O ponto exato era o que antecedia o estouro, só podia ser descoberto quando não adiantava mais nada.
Você só sabe até onde pode ir quando já foi.Também não me lembro que uso simbólico fazem, no filme, dessa atormentada obsessão do personagem, nem como ela se encaixava na trama. Devia ter algo a ver com
nossa relação com o tempo e o autoconhecimento. Afinal, nossa biografia só faria sentido para nós depois de nossa morte, literalmente depois do último hálito, quando nada mais faz sentido para ninguém. A trama certamente não terminava bem. Desconfio que o Mastroianni morria no fim, não de filosofia de mais, mas assassinado por alguém aos gritos de “Pare com esses malditos balões!”(...)