quinta-feira, 16 de abril de 2009

cineastas suecos


CARNAVAL

Por Adriana Lisboa; publicado na revista digital "Paralelos" em 14.02.2005:

Você escolhe a fantasia para o carnaval. Pode ser a camiseta do bloco. Pode ser alguma coisa com um brilho de avenida. Pode ser só o ânimo da rua. Pode ser o eco do salão. Pode ser inclusive o seu rosto impassível: não gosto dessa coisa de carnaval e pretendo ficar os quatro dias em casa, em companhia do cineasta sueco. Isso também é fantasia. Também é carnaval. Você sabe que não se basta. As fantasias, deste e de todos os carnavais, sempre foram o esqueleto que te sustenta, por fora, como acontece com os insetos. Desde o primeiro dia, desde o primeiro carnaval. E quem seria você, sem elas? Um fantasma. Um torrão de barro seco em que nenhum deus se lembrou de soprar o bafo da vida. Um ruído branco. Um enredo de história tola e tristemente óbvia. Faltaria um mistério ao seu riso, faltaria um riso ao seu olhar. E faltaria um certo peso trágico aos seus pés, que andariam por aí sem marcar o chão. Você escolhe a fantasia para o carnaval. E bem sabe (ou não sabe?) que não há um você de verdade por baixo dela. Sob as lantejoulas fica a pele, e sob a pele outra camada, mais secreta, de lantejoulas, e mesmo bem lá dentro, na soleira da sua alma, nesse abismo só seu, onde as coisas desconhecem o tempo e o diamante se sabe carvão - mesmo lá dentro: outras fantasias, outras lantejoulas. Outros carnavais.

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