Joseph Conrad costumava acompanhar as informações sobre o tráfego marítimo nos jornais. Procurava notícias de barcos que conhecia ou em que tivesse trabalhado nos seus tempos de marinheiro. Encontrar o nome de um barco que tripulara na mocidade devia ser como descobrir o nome de uma antiga namorada numa crônica social, casada com outro.
Hoje os perigos do mar continuam os mesmos, mas qualquer caíque sabe sempre exatamente onde está e pode transmitir sua localização e sua condição em segundos. E mesmo quem não enfrenta os mares misteriosos pode dizer o espaço que ocupa na paisagem com precisão. Ao contrário dos nossos barcos, continuamos sendo matéria de especulação literária. Em nós, quase sempre há uma crise não só de velhas certezas ideológicas e morais, mas de velhas certezas científicas também, e não passa dia em que não se descubra que o Universo não é nada do que se pensava, ontem.
Não admira que as pessoas cada vez mais renunciem ao racional – que, afinal, nos deu o satélite rastreador, mas nos deixou mais desorientados do que antes – e busquem o místico, o tribal e o maluco. Na falta de instrumentos precisos para mapear a angústia apela-se de novo para entranhas de pássaros, deuses selvagens e a anulação dos sentidos. E mesmo longe de qualquer porto ou socorro, ou de qualquer redenção para a sua culpa, nenhum herói embarcado de Conrad tinha razão para duvidar das estrelas sobre a sua cabeça ou da bússola à sua frente, ou dificuldade em identificar seu lugar no mundo.
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