segunda-feira, 11 de maio de 2009

no princípio era o texto- PARTE DEZ - MACHADADAS


91. Quincas Borba:
RUBIÃO fitava a enseada, - eram oito horas da manhã. Quem o visse, com os polegares metidos no cordão do chambre, à janela de uma grande casa de Botafogo, cuidaria que ele admirava aquele pedaço de água quieta; mas, em verdade, vos digo que pensava em outra cousa. Cortejava o passado com o presente. Que era, há um ano? Professor. Que é agora? Capitalista.


92.A Mão e a Luva:
-- Mas que pretendes fazer agora?-- Morrer.-- Morrer? Que idéia! Deixa-te disso, Estêvão. Não se morre por tão pouco...-- Morre-se. Quem não padece estas dores não as pode avaliar. O golpe foi profundo, e o meu coração é pusilânime; por mais aborrecível que pareça a idéia da morte, pior, muito pior do que ela, é a de viver. Ah! tu não sabes o que isto é?-- Sei: um namoro gorado...


93. O nascimento da crônica:
Há um meio certo de começar a crônica por uma trivialidade. É dizer: Que calor! Que desenfreado calor! Diz-se isto, agitando as pontas do lenço, bufando como um touro, ou simplesmente sacudindo a sobrecasaca. Resvala-se do calor aos fenômenos atmosféricos, fazem-se algumas conjeturas acerca do sol e da lua, outras sobre a febre amarela, manda-se um suspiro a Petrópolis, e La glace est rompue; está começada a crônica.


94.Dom Casmurro:
Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos. A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus. Sucedeu, porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.

95. O Empréstimo:
Vou divulgar uma anedota, mas uma anedota no genuíno sentido do vocábulo, que o vulgo ampliou às historietas de pura invenção. Esta é verdadeira; podia citar algumas pessoas que a sabem tão bem como eu. Nem ela andou recôndita, senão por falta de um espírito repousado, que lhe achasse a filosofia. Como deveis saber, há em todas as coisas um sentido filosófico. Carlyle descobriu o dos coletes, ou, mais propriamente, o do vestuário; e ninguém ignora que os números, muito antes da loteria do Ipiranga, formavam o sistema de Pitágoras. Pela minha parte creio ter decifrado este caso de empréstimo; ides ver se me engano.






















96. Suje-se GORDO!:

UMA NOITE, há muitos anos, passeava eu com um amigo no terraço do Teatro de São Pedro de Alcântara. Era entre o segundo e o terceiro ato da peça A Sentença ou o Tribunal do Júri. Só me ficou o título, e foi justamente o título que nos levou a falar da instituição e de um fato que nunca mais me esqueceu.

97. A Cartomante:
Hamlet observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de Novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras.

98. Desejada das Gentes:
— Ah! conselheiro, aí começa a falar em verso.
— Todos os homens devem ter uma lira no coração, — ou não sejam homens. Que a lira ressoe a toda hora, nem por qualquer motivo, não o digo eu; mas de longe em longe, e por algumas reminiscências particulares... Sabe por que é que lhe pareço poeta, apesar das Ordenações do Reino e dos cabelos grisalhos? É porque vamos por esta Glória adiante, costeando aqui a Secretaria de Estrangeiros... Lá está o outeiro célebre... Adiante há uma casa...

99.Idéias do canário:
Um homem dado a estudos de ornitologia, por nome Macedo, referiu a alguns amigos um caso tão extraordinário que ninguém lhe deu crédito. Alguns chegam a supor que Macedo virou o juízo. Eis aqui o resumo da narração.

100. Esaú e Jacó:

Era a primeira vez que as duas iam ao morro do Castelo. Começaram de subir pelo lado da Rua do Carmo. Muita gente há no Rio de Janeiro que nunca lá foi, muita haverá morrido, muita mais nascerá e morrerá sem lá pôr os pés. Nem todos podem dizer que conhecem uma cidade inteira.Era a primeira vez que as duas iam ao morro do Castelo. Começaram de subir pelo lado da Rua do Carmo. Muita gente há no Rio de Janeiro que nunca lá foi, muita haverá morrido, muita mais nascerá e morrerá sem lá pôr os pés. Nem todos podem dizer que conhecem uma cidade inteira.

2 comentários:

Agnes R. disse...

Opa! As Machadadas voltaram?!

Pablo Lima disse...

fazer o quê, se o dono da rua matacavalos vive voltando à capitania mental??