sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

13. O DESPREZO


Le Mépris, Jean-Luc Godard, 1963.

Abrindo a pretensiosa lista está "O Desprezo". Como pano de fundo, a "Odisséia" de Homero é rodada não em Ítaca, mas na paradisíaca ilha de Capri, e sob a direcção de Fritz Lang, o próprio diretor de "Metrópolis" em carne e osso e interpretando a si mesmo. Como figura, vemos a luta do indivíduo contra as circunstâncias da vida; se nos bastasse recordar que os velhos gregos vivem a dizer que o homem criou os seus deuses e, portanto, suas angústias, como vislumbrar isto a partir dos olhos de ninguém menos que Jean -Luc Godard ?



Podemos começar a análise com a seguintes propostas: o que significa fazer um filme ? a realização de uma obra cinematográfica seria uma representação da própria vida? ou seria a representação de algo já representado pela própria ficção? No meio deste turbilhão estão os deslumbrantes Brigitte Bardot e Jack Palance, que protagonizam os melhores momentos da trama.



Para quem já experimentou Godard, as suas três principais características afloram neste filme: 1) a metalinguagem; 2) os densos e complexos diálogos; 3) as superexposições de imagem.
Os múltiplos detalhes que encerram as diversas situações existentes no filme nos obrigam a deixar de lado os dilemas existenciais levantados pelo casal principal para relembrar de Godard em sua essência. As metáforas e analogias se fazem excessivamente presentes, sejam no discurso bilíngue - uma tradutora traduz as falas em francês para o inglês ao seu modo, o que serve de mote para outras subjetividades - ou nas questões levantadas acerca da obra de Homero, com as características do herói moderno recebendo o juízo dos gregos antigos.
A reescritura de "Odisséia" é clara e adaptada aos tempos de hoje, ou melhor, adaptada ao humano de qualquer época, pois os dilemas de outrora são os mesmos na atualidade. A relação entre Penelope e Ulysses é questionada no roteiro. Como sabemos, Ulysses também fora desprezado pela amante; mas desta vez quem vai embora é ela, Bardot, e na cia.do produtor, Palance.
O foco também está no cenário, com as cores branca, amarela e vermelha adquirindo signficados diversos importantes. A construção da dramaticidade é enriquecida através do cenário; como exemplo, a negra peruca usada pela personagem de Bardot encarna uma outra identidade. As imagens se multiplicam em intrincadas situações, com uso excessivo das possibilidades que o uso da câmera traria para a época.

E homenagear Godard é apenas um motivo a mais para falarmos de todos os grandes diretores da Nouvelle Vague, em especial Truffaut e Resnais, cujos delírios sempre nos deliciaram com imagens e planos num discurso em favor do prazer estético e do ensinamento moral. E tudo isto servindo como um libelo contra a fragilidade do homem em suas odisséias pela vida, pela filosofia e pelo existencialismo.

2 comentários:

Valéria Martins disse...

Querido, confesso que Godard é demais pra mim. Lembro quando a Casseta e Planeta tinha um bar em Botafogo e o cardápio, engraçadíssimo, continha o item "Panquecas à la Jean-Luc Godard, Chatas e enroladas".

Pablo Lima disse...

godard é mesmo disso, de nos deixar chateado e às vezes supreso; alguns dele tmb não gosto, o próprio "acossado" é um bom exemplo. mas o "desprezo" e outros garantem o nome do cara entre os maiores!

panquecas pro jantar?? tô dentro!