"O tempo do destino e da aventura é um tempo constituído pela palavra. A busca de André é compor tempo e palavra como gêmeos com as mesmas costas. A palavra,verbo oleoso, que reúne a lucidez e o delírio de André, nasce no charco, no lugar daqueles que não têm lugar. O tempo na palavra é o tempo que quer explodir, corroer o mundo que produziu o fosso onde o relegado sente-se jogado.
É o tempo da narrativa de Nassar que não se deixa capturar, apontando possibilidades de interpretação e sendo a principal mola para dissolvê-las. O romance é constituído por vários tempos num mesmo tempo e também por vários tempos que parecem não se conciliar, senão por um final destruidor. A falta de síntese entre os tempos fala sobretudo da condição do homem, em que o conflito das diferenças, a violência, a imposição de uma tradição e, o outro lado da moeda, o individualismo, põem em xeque a existência da própria humanidade, as suas instituições e a viabilidade da sua reprodução.
(Raduan) Nassar semeia as palavras para compor o tempo múltiplo da narrativa. Os dramas, conflitos e percepções humanas constituem a marca da própria linguagem. A busca pela escrita do tempo é uma atividade arcaica, uma lavoura da qual os homens se ocupam há milênios."
Por Francine Iegelski; resenha crítica do livro "Lavoura Arcaica", de Raduan Nassar, adaptado para o cinema por Luiz Fernando Carvalho.
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